quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Um menino chora de madrugada. Escuto-o chorar como se estivesse no meu proprio quarto. Acordo assustado e me levanto. As forças me traem e percebo que nunca me levantei. O choro começa a aumentar de tom, quase como uma musica antiga. Sinto vontade de chorar também. A luz entra por uma fresta da janela. Ja é dia. Mais um dia e tenho que levantar. A vida começa. A rotina de trabalhos, dores, amores. A busca incessável por algo fugaz, que aparece e desaparece como o menino que chorava. Não o escuto durante o dia. Passo pelas casas da cidade, os rostos do transporte publico, o portão que separa os trabalhadores do povo comum. Sento-me na cadeira e começo a viver. As horas passam deslizando pelos meus olhos. Uma vontade subita aparece em meu estomago. Uma tempestade que me faz perder o chão. Sinto que estou caindo, mas continuo sentado. Estou sozinho de novo. A cortina se encerra e me vejo preso nessa escuridão novamente. O choro que havia esquecido ressurge como um sussuro de plano de fundo. Finjo não ouvir. Ignoro enquanto posso. As pessoas passam novamente sorrindo. Uma musica cada vez mais alta me impede de pensar. O ar começa a ficar pesado. Sinto que vai chover. Ainda assim decido ir andando pra casa. De repente o choro fica mais forte. A voz fica mais alta, parecendo gritar. Meu coração dispara. Passo pela casa que nunca conheci quem mora, mas a vontade de entrar é grande. Paro por 2 segundos e observo. Devo? Não. Esqueço esse pensamento como quem esquece as magoas do passado. Continuo a caminhar com o coração aflito. Chego finalmente em casa (casa? sei mesmo o que é isso?) e espero a chuva chegar. Fecho as cortinas e deixo somente uma frestra pro ar passar. Deito na cama e penso no menino chorando. Ele está em silencio novamente. Vejo as sombras que se formam com o passar dos carros da rua. Começo a me perguntar se realmente consegui levantar aquele momento. Se não estou ainda pesado, sem forças, preso em meu mundo que parece nunca fazer sentido. O menino ainda em silencio parece ter desaparecido. Um sentimento de extrema solidão parece brotar. Não tenho nem mais meus fantasmas. Não tenho nem mais a mim mesmo. Perdi alguma coisa em algum lugar. O silencio da madrugada fere meus ouvidos. Só me resta rezar pro sono vir. E amanhã. Levantar novamente. Até o dia em que as forças me faltarem.