quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Mensagem em uma Garrafa

Ato I  - Empatia

Sinto que venho sendo injusto.
Quando criança sempre tive facilidade para o intuitivo e para o sentimental. Conseguia com uma tremenda facilidade entender as pessoas. Sentir o que elas sentiam.
Em contra partida, o lógico, o simples, o trivial. Nunca me veio fácil.
Sempre tive a sensação de que todos conheciam algo que eu não sabia.
Que o que me parecia sempre novidade, era algo que todos ja conheciam há muito tempo.
Sempre me senti um passo atrás, menos humano.
De tempos em tempos me via em situações onde pessoas cobravam-me algo que eu nunca recebi. Algo que eu nunca aprendi. Algo que eu nunca vivenciei.
Não sei se foi algum erro na educação, algum retardo mental ou o destino drummondriano que me afetou desse jeito.
Esse sentimento de desespero era ampliado, pelo desespero do mundo.
Que eu sentia, a cada pessoa, a cada nova vida. Que me olhava nos olhos, no fundo do meu ser.
E eu conseguia sentir. O desprezo, as expectativas, o amor sufocante, os desejos, os desesperos.
Tudo me vinha. E tudo eu sentia.
Essa faca de dois gumes foi o que sempre me aprisionou.
Tive que seletivar amigos, pois não aguentava sentir.
Esgotavam-me facil, a cada encontro, a cada conversa.
E eu queria ajudar, queria ser o motivo da alegria de alguem, curar todas as dores do mundo, ser o eixo que não quebra, que não entorta, que nunca sai fora do tom.
Aos poucos esses sentimentos me invadiam e me inundavam.
Aos poucos, não reconhecia mais quais eram os meus e quais eram os do mundo.
E eu cometi muitos erros, machuquei muitas pessoas sem necessidade, tudo por querer ser tudo pra todos. Ser o imbatível, o inabalável, o coringa da carta de baralho.
E eu fui me perdendo.
E eu fui enlouquecendo.

Ato II - A torre fulminada

Tranquei-me emocionalmente. Fechei-me numa torre perdida, no alto da colina de rosas vermelhas.
Passei a viver e refletir, e a conhecer o mundo. Observava de longe os passageiros. Trocava cartas, Mensagens em garrafas. Cantigas de roda.
Aprendi muito sobre o mundo olhando aqui de cima. Via as pessoas se divertindo, passando. Sempre tão facil, sempre tão normal.
Ao mesmo tempo em que esperava.
O que? Nunca soube.
Com o tempo as pessoas se perguntaram quem era o garoto preso no alto da torre.
Alguns até tentaram escalar e descobrir.
Mas a torre parecia crescer a cada metro subido.
O destino parecia rir das esperanças do menino.
E o menino começou a aceitar isso, e a deixar-se enganar pela escuridão que aos poucos parecia penetrar naquela torre.
Não havia companhia. Não havia corpo quente. Não havia proximidade.
A simples espera de algo impossivel, improvavel, inexistente.
Uma morte lenta parecia mais provavel.
Foi pouco a pouco fechando seu contato com a esperança.
Mas as dores do mundo continuavam.
Penetravam pelos raios de sol de cada fresta de cada janela.
De cada buraco por dentre as pedras.
A familia, os amigos com quem convivia, e o proprio reflexo no espelho,
pareciam enforca-lo.
Ele queria sair, fugir, conhecer coisas novas.
Não aguentava mais. Não sabia mais quem era.
Perdera sua identidade em indagações e esqueceu que a vida era algo mais.
E as dores desse menino, eu sentia como se fossem minhas.
Como se me torturassem toda a noite antes de dormir.
E eu não pude mais aguentar.
Escalei novamente aquela torre.
Aquela torre que sempre me pareceu cada vez mais distante.
Subi o maximo que pude. Subi o infinito e finalmente cheguei no topo para salva-lo.
E quando finalmente me dei por mim, estava sozinho no topo da torre olhando para meu proprio reflexo.
A imagem do menino cuja identidade se perdeu em algum momento dessa história.
E um raio partiu essa torre ao meio. E tanto eu quanto esse reflexo caimos.
Indefinitamente. No amago desse universo.
Estilhaçaram-se no chão e só um se levantou.

Ato III - Signo de Gemeos.

As dores ampliadas da queda me ajudaram a reconstruir meu ser. Eu senti uma dor que era tão minha, quanto do mundo. E isso me era ampliado indefinidamente.
Aos poucos aprendi a filtrar. O que era meu e o que me era alheio.
Tive que cortar relação com o mundo para conseguir isso.
E me pus a andar. Caminhei por caminhos tortuosos, que levavam a lugar algum.
Conheci pessoas de perto. Precisei de pessoas. Precisei de carinho.
Aos poucos passei a não me importar.
As dores do mundo que tanto me assolavam pareciam diminuir até se tornarem insignificantes.
Tornei-me um tanto quanto niilista.
Mas pelo menos algo estava acontecendo.
Sentia o crescimento acontecendo.
Quanto mais conhecia o mundo, mais o mundo entrava em mim.
E eu passei a entender o mundo como um todo,
Passei a desvendar os misterios, e achar respostas.
Fui pra outro país. Fui pra outra linguagem. Fui pra outro mundo.
E o que encontrei foi novamente a sensação de atraso.
De que os anos que passei naquela torre, ocasionaram a perda de grande parte da minha vida.
Novamente as pessoas pareciam dez até quinze passos à frente.
E eu sinto a ansiedade tomar conta de mim.
Novamente me sinto julgado, por ser algo diferente, por ser alguem diferente.
Sinto que não importa o quanto você corra, o mundo sempre vai esperar mais de você.
Sempre vai te puxar pra frente até você quebrar.
Vai te atropelar como uma roda que não pode ser parada.
E eu decidi marcar o passo. Correr.
Sinto que estive sendo injusto por muito tempo.


Ato IV - Revelação, Karma e Decisões
(Antes que se passe um segundo, você terá morrido cem mil vezes)

Essa injustiça é uma traição. Minha para com as pessoas que um dia chamei de amigo.
Como sempre fui de sentir o coração das pessoas. Aprendi a manipular certos acontecimentos para conseguir um pouco de paz, um pouco de ar para respirar. Sentia-me o vilão dos quadrinhos, com uma mentalidade diabólica. Sentia-me egoista por não conseguir ser a altura dos sentimentos do mundo. Das expectativas. Dos amores. Do status quo. Como se sempre estivesse à beira de decepcionar alguém pelo simples fato de existir. E de mentir. E de tentar ser o que as pessoas queriam que eu fosse. Por isso sempre foi dificil viver em sociedade. Por que socializar era mentir. Era sempre estar atento. Era não deixar transparecer. Era sempre estar a beira de ter que fugir caso tudo explodisse.
Ao escrever essas palavras, até me assusto com o quanto elas traduzem o meu eu. O quanto elas traduzem diversos episodios da minha vida.
E acho que preciso começar a correr, para alcançar o que ainda me parece tão longe.
O que parece simples para todos, mas pra mim ainda é complicado.
O que eu cismo em deixar me enforcar.
E o primeiro passo é assumir a verdade.
A verdade que até tentei dizer um dia na calada da noite, de madrugada.
E a verdade, mesmo que simples, é essa.
Sou gay.
Incontestavelmente homossexual.
...

E de repende as palavras me faltam para continuar.
O que nunca estive preparado para. O que sempre me deu medo.
A verdade que tira meu mundo dos eixos.
Enfim, deixarei por aqui essa mensagem perdida nessa garrafa ilusória.
Que os bons ventos a levem...




terça-feira, 16 de dezembro de 2014

OH my heart

“Sometimes I’m terrified of my heart; of its constant hunger for whatever it is it wants. The way it stops and starts.”


Preso num labirinto a-dimensional. Sem saber que porta abrir. O caminho some debaixo dos meus pés. Nao sei pra onde quero ir, pra onde estou indo, de onde vim.  Estou a me perder em questionamentos sem finalidade. Estou a me perder em afirmações segregadas. 
Nao sei o que sinto. 
O que sinto vem, passa, fica, volta, some, desaparece. 
E eu começo a me perguntar o quanto algo pode realmente durar?
O quanto vai valer? 
Haverá algo que será permanente? 
Ou estou fadado a esse passar, esse nunca descer em nenhum ponto. 
Por nunca parecer perto o suficiente de casa.
Nao sei o que sinto. Se sinto. Se imagino ou se crio enquanto entediado.
Amo o que não é. O que nunca será. O que nunca nem poderia ser. 
Amo o que me falta, o que não está na minha frente, mas no fundo do copo de bebida. 
Procuro insolentemente e grito pra todos os lados com razão.
Mas a razão me some, a vontade de gritar me some, 
E tudo isso implode dentro de meu peito, 
E eu canso. De viver, de morrer, de existir.
Sinto um estranho dentro de mim, que todo dia muda de face, muda de voz, muda de ideia.
E sussura no meu ouvido frases que nunca quero ouvir, que sempre quero ouvir, que nao sei de onde surgem. 
Frases que já ouvi, que ja disse, que simplesmente criei.
Eu estou perdido. Achado. Acorrentado num barco sem rumo. Sem vento. Sem cais. 
A vida me passa, em quadros emoldurados que ja nao pareço conhecer.
Pessoas me surpreendem e logo após me aborrecem.
Minha paciencia se vai junto com minha capacidade de ser surpreendido.
Nada novo ai. 
A palavra do ano é: Falta de
Muita coisa mudou, e eu vejo isso como avanço.
Avanço pra onde? Ainda não sei.
Mas nao quero voltar. 
Ainda não ao menos. 
Sinto que existe uma nova sala, novas portas, novos quadros, 
prontos para serem emoldurados.
Quero que tudo queime. Tudo que nao me faz bem, nunca me fez, nunca me fará.
Quero o sol, a lua, em trigono com o horizonte.
Quero uma nova velha vida, que nao se cansa de desaparecer por entre meu toque. 
Quero algo que dure. Que perdure. Que sobreviva.
Algo que eu nao consiga matar e que nao me mate com o tempo.
Que de dor e alegria já vivi até demais.
Quero algo maior. 
Quero certezas, quero o divino.
Quero apostar todas as cartas, jogar outro jogo. 
Mudar os jogadores.
Chega de jogar. 
Chega de ter esperanças.
Aderi ao diabo do meu ombro, 
enquanto o anjo-peste, que nunca me larga, dorme

sábado, 15 de novembro de 2014

Weltschmerz

Ando sem paciência. Irritado. Misantropo.
Não acho motivo ou explicação.
Sinto um desapego muito forte.
E ao mesmo tempo, uma perdição em meio a tanta dor.
Atacado por todos os lado.
A sociedade parece me sufocar.
O mundo parece fora dos eixos,
perdido em meio ao nada.
Caos, entropia...
Sinto intolerancia, mente fechada.
Desamor, Desprezo.
Enforco esses sentimentos como quem enforca a si mesmo.
Quero o mundo novo, a cura, a esperança de volta.
Mas só vejo mortes, morte de tudo que é digno e sagrado.
Por uma apatia.
E eu começo a ser infectado.
Só me resta morrer aos poucos.
No esquecimento desse mundo onde tudo passa
Tão rapido, tão efemero.
Inutilmente fadado a ser esquecido.
Como se nossas dores, nossas qualidades, nosso ser,
Sejam coisa pouca.
Mas se algo que é tão grande pra si, que quase nao cabe no peito,
Que quer explodir, fazer todos notarem.
Pode ser algo tao pequeno?
Me sinto infinitesimal.
Nao sei mais o que é importante.
Se há algo de importante.
Quero alguem que nao se contente com essa imparcialidade,
nem com esse isolamento de ser.
Alguem que esteja longe de ser eu.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Credo

Acredite nas pessoas. Não esqueça. Só o outro pode te mudar de verdade. Você, sozinho, estará sempre limitado. Abra portas. Não se feche. É necessário aceitar o mundo se voce quiser evoluir e entender. Seja o que for. Abrace o mundo. Conheça as profundezas de todas as cavernas, a sombra de todas as rochas, os raios de todos os sóis. Seja a luz e a sombra. Não esqueça.

Não esqueça disso.

As pessoas são o meio. Não o fim.

Absorva.

Tenha fé.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Silêncio (Parte 3)

O resumo do meu "eu", minhas crenças e virtudes. Dão-me o ar que necessito. Que me ajuda a sobreviver. Ainda não parecem perfeitos. E nem devem ser. Devem continuar sendo destruidos, reconstruidos, melhorados. Mas nunca estagnados. Nunca absolutos. Nunca atemporais. O movimento é a lei do mundo. Tudo é incerto. Tudo é sagrado. As mudanças são inevitaveis. E a vida é curta demais. "Carpe Diem" já diziam os antigos, mas sempre me pareceu tão errado essa frase. Ou talvez certa demais. Não sei dizer. Ainda me debato, ainda me perco em meus pensamentos, e ainda insisto em escrever, como que para ninguem, como que para todos. Continuarei procurando respostas, um pilar que suporte esse mundo, caótico. E mais do que respostas, espero uma solução. Algo que possa ser feito. É inutil ir sozinho sem trazer alguem consigo. Ou talvez seja arrogancia demais. Mas ainda há muito tempo pra isso. Espero que meu silêncio não aflija mais ninguem. Que minhas duvidas que tanto saboreio, que tanto me dão prazer. Não sejam mais vistas como algo rude ou o laço que me enforca. Porque afinal, "é preciso ser assim...". Tenho medo de absolutos. Tenho medo de generalizações. Cada alma é uma estrela, e cada estrela é unica. Mas todos iluminamos o mesmo céu.

Eco (Parte 2)

Vou resumir um pouco das coisas que aprendi.
1. Liberte-se e deprograme-se. Livre-se de tudo que parece não funcionar na sua vida. Duvide de qualquer certeza, Não tenha medo da duvida. Pare de se preocupar com o que não pode ser resolvido, ou o que não tem solução. Pare de mendigar felicidade, de viver de estilhaços.
2. Desapegue-se de conceitos e expectativas. Não crie preconceitos com palavras. Religião, Deus, Biblia, Esquerda, Socialismo, Vegan, Gay, Negro, Preconceito... Palavras que parecem pesadas e cheias de significados que devem ser desconstruidos sem medo. Não tenha medo de palavras ou conceitos.
3. O mundo não te decepciona. Você sim se decepciona. A decepção é a inutil tentativa de ir contra a realidade em que se vive por preferir uma idealização criada por você mesmo. Simplesmente aceite o mundo como é, com suas falhas, virtudes, mudanças, erros. Deixe de culpar as pessoas por seus pecados pessoais.
4. Tente evitar usar o pronome "eles" e sempre que usar, reflita sobre o que você realmente está dizendo. Evite qualquer pensamente separatista que te afaste ou te separe de determinado grupo. "Os religiosos", "Os crentes", "Os ignorantes", "Os homossexuais", "eles", "eles", "eles". No fundo somos todos unicos, não existem "eles", existe "eu" e o "mundo" e todos somos um.
5. Não tenha medo de esperar. O mundo não vai acabar amanhã, e mesmo que acabe, não há nada que possa ser feito. Não crie ansiedades desnecessárias. Faça o que você puder fazer, de o maximo de si, mas pare de se frustrar por falhas e conquistas. Pare de tentar suprir as expectativas do mundo, e tenha mais orgulho de si.
6. Evite machucar os outros. Ninguem gosta de ser machucado e no fundo você sabe que mesmo que você se sinta bem por um tempo, aos poucos você começa a se perder em tanto ódio. Mas lembre-se do numero 3, não tenha medo de quebrar expectativas, elas não são sua culpa. Saiba filtrar o que vem de você e o que não vem.
7. (Que duvida que ia ser o ultimo). Não tenha medo da verdade. Não tenha medo de ponderar o que parece irreal. Não tenha medo de dizer pra si mesmo o que está errado, o que está certo, o que deve ser mudado e o que não funciona mais. Pelo menos pra si mesmo, seja verdadeiro, saiba quem você é. Se for mentir, minta. Se for ser injusto, seja. Mas faça isso com sinceridade. Por incrivel que pareça, muitas mentiras e problemas podem ser evitados com uma simples conversa consigo mesmo.

Ruidos (parte 1)

Não sei quando me tornei tão indiferente,
Estoico ou cinico.
Os dramas que a vida me traz, hoje parecem tão indiferentes.
Sem paciência pra lutar,
Sem paciência pra me importar.
Tornei-me apatico à quase tudo.
Nada me move, nada me instiga apreço.
Não sinto mais nada,
A felicidade me é morna,
A tristeza me é rotineira.
Não sinto desejo de voltar.
Não sei para onde ir.
Suficente? Longe disso,
Mas a alternativa também não me agrada.
Fujo de qualquer traço humano enquanto me escondo em mentiras.
Que cada vez mais parecem verdades.
Eu odiava isso. Nunca quis ser assim. Indiferente.
Mas quanto mais a vida passa, mais tudo parece insignificante.
Nossos dramas eternamente fadados a se repetir.
E com que finalidade?
Acreditava que havia algo à ser aprendido, mas só esperava que as velhas historias parassem de tentar nos machucar, tentar nos redimir.
Não, eu não achei nenhuma resposta ainda. Mas não quer dizer que tenha desistido.
Só não vou ficar parado enquanto há tanta coisa ainda para ser descoberta.
O mundo me freia. Tentam fazer eu me sentir culpado por querer mudar, querer avançar.
Querer experimentar coisas que nunca tive oportunidade antes.
Explorar cada canto obscuro do meu ser.
E que até onde eu sei, é ai que se começa a filosofia.
Quero me conhecer mais, e cada vez mais descubro algo novo sobre mim,
E por enquanto é a unica coisa que me move, que finalmente faz sentido.
Vou devagar, vou sem forçar nada.
Continuo indeciso, claro que sim.
Decisões nunca foram meu ponto forte.
Sempre tive medo das consequencias, do que cada escolha pode trazer.
Mas novamente o mundo tem me tornado indiferente a esses empecilhos.

domingo, 3 de agosto de 2014

O perdedor está só

Vencer não é pra mim. Nunca foi.
Desde que me lembro, sinto que cada objetivo meu é um grande fracasso.
Ou pelo menos nunca algo cem porcento perfeito.
Sou amaldiçoado com o mediano. O Comum. O nunca ser extraordinário;
Procuro sem cessar por uma vitória.
Mas a cada derrota, um pedaço de mim se vai.
Some. Morre. Quebra. Sangra.
E aos poucos tenho que pensar antes de responder perguntas como
"Qual sua idade?"
De fato o tempo passa, e sinto que estou numa eterna frenagem.
Como se nada pudesse ser alcançado sem atrito.
Arrasta, não flui.
Eu queria paz.
Só paz.
Mas nem isso eu consigo.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Desfiguração

O corpo cai e some em meio a nevoa.
A passagem por entre os deuses se fecha,
Seria eu honrado o suficiente?
Não. Obvio que não.
Não mereço a dadiva celestial,
O sangue dos meus antepassados
Ainda que jorrados pela terra aos quatro ventos
De nada serviu como preço
Pela punição.
Vivo sem dor, sem rumo, sem gracejo.
Sem perseverar.
Me abasteço de ilusões.
Enganos, Caminhos errados.
Me apaixono pelo que nunca será;
Vivo o que nunca vai ser.
Me deixo levar, me abstenho, dou minha opinião faço gracejo;
Só me falta a paz, a vitória, a conquista.
Coisa que nunca será minha.
Coisa que sempre estará um passo mais longe.
Fora do alcance.
Fora de vista.
Tão perto, e ao mesmo tempo desconcertantemente longe.
Não sei como ainda aguento o peso do mundo em mim mesmo.
As pessoas, me decepcionam.
Desejo a vida, à essa constante segregação
Nunca pertencer.
Nunca estar satisfeito.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

O eterno transtorno.

Escuto o som de algo se quebrando.
Não sei ao certo de onde ele vem. 
Procuro os pedaços de algo pelo escuro do meu quarto. 
Um fio de luz atravessa a cortina e me cega momentaneamente. 
Não me encontro mais em meu quarto. 
Algo se quebrou e estou num lugar estranho. 
As pessoas passam sem me reconhecer. 
Me vejo num corpo estranho, com o qual sigo perdido,
Não sei usá-lo.
Percebo que estou sangrando. 
Procuro uma ferida qualquer e não acho.
Desisto de procurar. Deixo a dor me anestesiar.
Retorno ao quarto da penumbra cinzenta.
Direciono-me à janela, mas quanto mais perto pareço estar
Mais se afasta o meu destino. 
Corro como quem houve o som de um disparo de corrida,
Não posso perder. 
Não mais. 
A luz continua inatingivel, e por um momento me falha a esperança. 
Escorrego e caio pela janela. 
Um momento de silencio,
O mundo como um eterno borrão
E o som de algo se quebrando. 

domingo, 27 de abril de 2014

“I want to tell you something today, something that I have known for a long while, and you know it too; but perhaps you have never said it to yourself. I am going to tell you now what it is that I know about you and me and our fate. You, Harry, have been an artist and a thinker, a man full of joy and faith, always on the track of what is great and eternal, never content with the trivial and petty.But the more life has awakened you and brought you back to yourself, the greater has your need been and the deeper the sufferings and dread and despair that have overtaken you, till you were up to your neck in them. And all that you once knew and loved and revered as beautiful and sacred, all the belief you once had in mankind and our high destiny, has been of no avail and has lost its worth and gone to pieces. Your faith found no more air to breathe. And suffocation is a hard death. Is that true, Harry? Is that your fate?” - Hermann Hesse

Hoffnung

Não sei dizer ao certo. Sinto um cansaço do universo. Como se tivesse cansado de sempre obter os mesmos resultados. É tudo tão previsivel que parei de me surpreender com as trevas susurrando nos meus ouvidos. O terrivel não é mais tao assustador. A solidão não me deixa mais triste do que o normal. Sinto que me acostumei com essas escuridão. Estou começando a aceitar as coisas como são e simplesmente aproveitar o pouco que sobra, que nunca me é suficiente. Mas o que mais posso fazer? Já tentei muitas coisas. Mudei de país, de lingua, de costumes. E ainda assim, aquilo que mais procuro, me falta. Não esta nos livros, nos amigos, nos desconhecidos, nas coincidências, nas rezas, na minha mente.
Não está em nenhum lugar, não existe.
Nada mais é tão dramático. Nada mais me deixa indignado.
Não tenho mais o que escrever aqui, além de puro cinismo .
Se quiser vir, que venha, se sumir, não me fará falta.
A dor não me afeta mais como antes.
Não sinto mais nada que me mova. Nada que me faça pular do precipicio. Nem precipicio vejo mais.
Só o céu. Cansei de ficar na beira do precipicio. Vou deitar aqui e olhar pro céu. Até que a noite caia e as estrelas me ceguem. Que a chuva venha se misturar com as lagrimas de meu coração. Que o sol seque minha agonia e me deixe seco, oco, vazio. Que o vento me leve daqui.

Só quero paz. Não peço nada mais que isso.

Não venha tentar agitar o meu mundo. Meu mundo está girando na velocidade certa.

sábado, 22 de março de 2014

Desabafo

Confesso que ao vir para um mundo novo, esperava muito mais. Não querendo ser ingrato, muito pelo contrário, agradeço muito a oportunidade de estar aqui, porém não consigo tirar da cabeça que ainda falta algo.
Vem sendo um desafio morar nesse novo mundo. Sim. Porém um desafio que é muito mais sobre adaptação. Adaptação a novos costumes, novas formas de fazer as coisas, novas moedas, novos idiomas. É difícil, mas nada impossível.
Não estou desmotivado, não estou triste, não estou com saudades de casa. Não.
Só esperava mais. Mais que um desafio de adaptabilidade.
Sim é algo para aprender coisas novas, ver o mundo de outro jeito. Ok.
Mas era o esperado não?
Cade aquele algo mais, que minha intuição me fez acreditar. Que aos poucos foi o que me moveu aqui.
Esperava muito mais uma mudança existencial do que um simples teste de adaptação. Esperava que algo aqui pudesse me ensinar algo mais sobre mim mesmo, esperava achar pessoas diferentes, mas a verdade é que achei pessoas iguais as que eu sempre conheci. A unica diferença é que eu sou o estrangeiro, o que não pertence a essa sociedade, e a tendencia é muito mais de me afastarem do que de me acolherem.
A verdade é que estou sem amigos ainda, mas a verdade mais cruel é que não conheci ninguem com quem eu queira fazer amizades.
Passei semanas irritado sem ter com quem sair e me ajudar, mas aos poucos fui percebendo que não era bem esse o problema.
Pessoas sociaveis aqui não faltam, é verdade. Encontrei pessoas que me acolheram e que estao dispostas a ser meus amigos. Tudo que falta é eu dar o primeiro passo. Mas o mais assustador é eu não sentir simpatia por elas. Não querer ser amigos delas.
Pode parecer meio cruel, mas de certo modo é verdade. Não senti afinidade por ninguem ainda.
Não quer dizer também que eu odeie a todos, longe disso. Agradeço muito a simpatia de todos aqui, mas ainda falta alguma coisa. 
Meu coração não me guia mais, ele está calado. Eu me sinto perdido. No fundo sempre escutei uma voz que me dizia o caminho que era o certo (ou o caminho pelo qual eu queria percorrer de verdade). Aqui não, essa minha voz interna sumiu, e me deixou largado sem saber o que fazer. O que me movimenta é meu racional, sei o que preciso fazer e tento ao maximo sobreviver. Mas isso deixou a muito tempo de ser vida. Não estou sozinho, só estou só. E não sei se essa minha intuição vai voltar tão cedo.
Algo me diz que tem algo chegando, que eu não vim pra ca por nada. Os sinais as vezes me aparecem e a certeza me vem. Só não sei que caminho escolher.
Antigamente eu via um precipicio, mas eu sabia que quando eu desse o proximo passo, o chão se criaria na minha frente e eu atravessaria. Hoje o mesmo precipicio me da medo, e a duvida me impede. Não é o medo de cair, é a ignorancia de não saber em que parte do precipicio dar o primeiro passo.
Não saber pra onde ir. Se sentir desnorteado.
E todo mundo usar o imperativo comigo, também não ajuda.
"Vai viajar. Leva o lixo pra fora. Visita um museu. Bate fotos. Vai ao cinema. Deixa a timidez de lado. Mude. Seja amigável. Faça amigos. Saia de casa"
Eu realmente não sei.
Perdi o mapa de minha mente.
E não vejo nenhum ponto que possa me ajudar a me achar.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

"Tertuliano Máximo Afonso pousou o telefone, cerrou os olhos e ouviu Maria da Paz a rir e a gritar, Mãezinha, mãezinha, depois viu as duas abraçadas, e em vez de gritos, murmúrios, em vez de risos, lágrimas, às vezes perguntamo-nos por que tardou tanto a felicidade a chegar, por que não veio mais cedo, mas se nos aparece de improviso, como neste caso, quando já não a esperávamos, então o mais provável é que não saibamos que fazer, e não é tanto a questão de escolher entre o rir e o chorar, é a secreta angústia de pensar que talvez não consigamos estar à altura."

O Homem Duplicado - Saramago