quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Duas velas

O fogo de duas velas queima enquanto escrevo essas palavras. O ardor esquenta e deixa um leve aroma de fogo pelo ambiente. A leve penumbra se mistura com o gosto de cigarro. Uma dor que há muito me era como um estranho caminhando por uma rua deserta pela madrugada. A busca por uma esperança que parece me escapar pelos dedos. Uma força imensa em esticar e buscar com todos os meus arrepios. Uma energia que me é tão familiar. Uma dor que não sei se é minha ou se é sua. 
Despistei meu eu do passado por muitos anos, mas o revivi essas noites. Trouxe de volta, como um velho amigo que me traz um mal presságio. 
Desvendo todas as partes desse ser, sento com ele cada noite vazia. Brinco de xadrez mental com esse visitante, mas cada movimento sinto que estou cometendo um erro. 
Quando pressinto a vitória, um vento bate forte e muda as peças de lugar. (que erro, onde estava ?) 
As peças se desfiguram e se tornam palavras (abandone as esperanças!)
Algo em mim ainda cisma em acreditar.
Algo em mim ainda quer ver a luz por detrás dessa escuridão (não haveria de vê-la? basta olhar mais perto)
Queria poder quebrar esse vidro. Essa areia que cai e me afoga. O tempo que se foi e que se vai. 
Algo em mim grita. Coloco-me a andar. (em busca do que?) 
uma visão, um sussurro, um carro no meio da noite
Mas ah, como todas as vezes, me perco por essas ruas. Esses rostos que me olham e me julgam e me condenam. 
Como pode ser? Que aquilo que tanto me dói está cravado no fundo do coração dessa pessoa.
E não vejo como me aproximar sem me machucar. (essa dor é sua)
Mas ah, como todas as vezes, insisto em destruir. O caos me embebeda em busca de uma ajuda. (se eu já caminhei por esse labirinto, por que não me segues?)
Não é tão simples. Não achei saída, mas achei paz. Busquei a felicidade na jornada e encontrei um amor que há muito me faltava (não você)
Queria te levar comigo, mas é um convite que não faço em voz alta (talvez por já saber a resposta)
Não quero fugir mais. Eu sei quem eu sou. Eu sei de onde eu vim. Eu me lembro. (não consigo esquecer)
E essas dores cristalizaram em mim, mas queimam com seu olhar. Queimam com sua voz. Queimam com seu toque. 
Eu quero transformar o amargo em doce. Eu quero beber dessa água suja para que tu possa bebe-la límpida.
Não posso querer tanto, posso? (quem sou eu pra guiar alguém)
Mas algo me diz, algo vibra em mim, meu corpo se move sem minha permissão. Minha voz sai falhada. Sinto que se não me segurar, meu corpo flutuaria em sua direção.
A verdade é que eu não sei mais o que fazer (e há algo a ser feito?)
O ser soturno do passado tenta me abrir os olhos (não há luz adiante)
Mas como posso confiar? Como posso confiar em quem me enforcou. Como posso ter que escolher a espada que me atravessará, quando o que mais quero é te abraçar. 
Pois eu perdi o medo há muito tempo. Essas sombras não me apavoram mais. Essa imensidão de "quases", fiz dela minha cama. 
Se queres ir, vá. Não se demore aqui. Estou bem comigo mesmo. 
Mas se quiser ficar, vai ter que acertar o passo. Não te sigo para a perdição. 
Alçamos voo para o sol. De inverno já basta tudo que abandonei. 
Não quero mais dor. Não quero mais pesadelos.
As velas estão quase se apagando. Qual delas se apagará primeiro?